Iniciamos uma série de vídeos no nosso canal (link no final dessa postagem), comentando aspectos que se inserem no contexto do requerimento e formação do inventário.
Tomamos como ponto de partida o óbito, destacando o roteiro a ser seguido até a sua lavratura. Depois falamos acerca da Ausência, destacando o tema dos Desaparecidos, indivíduos que voluntária ou involuntariamente, consciente ou inconscientemente, desaparecem sem deixar vestígios. Independente da forma como se dá um desaparecimento ele sempre gerará a Ausência, um processo no qual, esgotados todos os esforços para a localização e reintegração do ausente na posse de sua vida social e patrimonial, sem sucesso, culmina na chamada morte presumida, momento em que o ausente é dado como se morto estivesse.
O inventário é um procedimento, que pode ser judicial ou extrajudicial caso atenda as regras estabelecidas em lei. Tal procedimento comportá as seguintes etapas:
a abertura do inventário,
a nomeação do inventariante,
o oferecimento das primeiras declarações,
a citação dos interessados,
a avaliação dos bens,
o cálculo e o pagamento dos impostos,
as últimas declarações,
a partilha e sua homologação,
expedição dos álvarás e Carta de Adjudicação ou Formal de Partilha, documentos finais para a efetiva transmissão e deslocamento dos bens para os respectivos herdeiros.
Mas afinal o que é o Inventário?
Quando uma pessoa falece e deixa bens, é necessário verificar quem tem o direito de ficar com este patrimônio deixado pelo de cujus (falecido).
Temos aí o famoso princípio de Saisine
- O qual se estabelece que a posse dos bens do "de cujus" se transmite aos herdeiros, imediatamente, na data de sua morte, sendo deferida como um todo unitário, e, até a partilha, o direito dos co-herdeiros quanto à posse da herança será indivisível, regulando-se pelas normas relativas ao condomínio, estabelecendo-se, assim, por força de lei, comunhão pro indiviso (Art. 1.791). Esse princípio foi consagrado em nosso ordenamento jurídico pelo art. 1.784, do Código Civil.
A forma de regularizar esta situação acontece através do procedimento do inventário e partilha que visa formalizar a transmissão dos bens do falecido para os seus sucessores (herdeiros).
O inventário, dessa forma, tem por objetivo a arrecadação, individualização, caracterização e avaliação dos bens e outros direitos, bem como a discriminação e pagamento de dívidas, pagamento de impostos rede transmissão mortis causa e demais atos e providências indispensáveis à liquidação do acervo hereditário. Faz-se para que seja possível promover a partilha ou adjudicação.
Maria Helena Diniz conceitua o inventário como sendo:
- "o processo judicial (CC, art. 1.796; CPC, art. 982) tendente à relação, descrição, avaliação e liquidação de todos os bens pertencentes ao de cujus ao tempo de sua morte, para distribuí-los entre seus sucessores" (Curso de Direito Civil, v. 6, p. 368).
Observe que nessa conceituação a Doutrinadora classificou o procedimento como sendo "processo judicial". Acontece que o artigo 982 do CPC, sofreu modificação no CPC de 1973 no qual destacava somente a possibilidade de tramitação do inventário pela via judicial.
- Art. 982. Proceder-se-á ao inventário judicial, ainda que todas as partes sejam capazes. (Redação dada pela Lei nº 5.925, de 1º.10.1973)
Depois esse artigo sofreu modificação pelas leis 11441/07 e 11965/09 possibilitando a solução do inventário pela via extrajudicial inclusive.
- Art. 982. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário. (Redação dada pela Lei nº 11.441, de 2007).
- Parágrafo único. O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. (Incluído pela Lei nº 11.441, de 2007).
- § 1º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado comum ou advogados de cada uma delas ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial. (Renumerado do parágrafo único com nova redação, pela Lei nº 11.965, de 2009)
- § 2º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se declararem pobres sob as penas da lei. (Incluído pela Lei nº 11.965, de 2009)
E finalmente o NCPC/2015, deu o golpe de misericórdia nesse artigo deslocando-o para o artigo 610 com apenas dois parágrafos.
- Art. 610. Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial.
- § 1º Se todos forem capazes e concordes, o inventário e a partilha poderão ser feitos por escritura pública, a qual constituirá documento hábil para qualquer ato de registro, bem como para levantamento de importância depositada em instituições financeiras.
- § 2º O tabelião somente lavrará a escritura pública se todas as partes interessadas estiverem assistidas por advogado ou por defensor público, cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
Então, podemos aditar na definição da Doutrinadora a possibilidade de inventário extrajudicial.
- "o processo judicial ou extrajudicial (CC, art. 1.796; NCPC, art.610) tendente à relação, descrição, avaliação e liquidação de todos os bens pertencentes ao de cujus ao tempo de sua morte, para distribuí-los entre seus sucessores" (Curso de Direito Civil, v. 6, p. 368). (Grifo nosso)
Ensina Zeno Veloso, jurista, notário, professor, deputado estadual e secretário de Justiça do Pará.
- que o inventário tem por objetivo a arrecadação, a descrição e a avaliação dos bens e outros direitos pertencentes ao morto, bem como a discriminação, o pagamento das dívidas e dos impostos e os demais atos indispensáveis à liquidação do montante que era do falecido (Novo Código Civil.., 2006, p. 1.657). O que se almeja, nesse contexto, é a liquidação dos bens e a divisão patrimonial do acervo hereditário.
O conceito de Veloso, aproxima-se do da Diniz, mas ambos esbarram subconceitos que se trabalhados em cenários hipotéticos, fragilizará a estabilidade do que que foi definido.
Por exemplo:
Sabemos que o inventário tem por objetivo a transmissão dos bens do morto, falecido, de cujus, do indivíduo que perdeu sua personalidade jurídica e dessa forma não é mais detentor de vontades e deveres. Observe que não digo "direitos", pois mesmo o morto possui direito. Senão vejamos o que diz o artigo 12 do Código Civil.
- Art. 12. Pode-se exigir que cesse a ameaça, ou a lesão, a direito da personalidade, e reclamar perdas e danos, sem prejuízo de outras sanções previstas em lei.
- Parágrafo único. Em se tratando de morto, terá legitimação para requerer a medida prevista neste artigo o cônjuge sobrevivente, ou qualquer parente em linha reta, ou colateral até o quarto grau.
Observe que existe a possibilidade da memória da pessoa morta ser ofendida e lesionada em sua personalidade. É bem verdade que o direito da personalidade visa tutelar e resguardar a dignidade humana e também estender isso à sua memória, cabendo os legitimados, que são os lesionados indiretos, ingressar com pedido de reparação através de uma ação que irá declarar se houve ou não lesão à memória, à honra, à integridade intelectual e moral do morto, do ausente ou do morto presumido.
A morte, a ausência ou a presunção da morte de um indivíduo, extingue fisicamente a pessoa mas não apaga nem deleta totalmente a memória, suas idéias, sua importância materializada em seus entes queridos, e toda contribuição realizada durante sua vida. Então entendo que o morto, ainda vivo no campo da memória, da honra e moral, possui personalidade jurídica.
Não há uma definição perfeita para o inventário.
O problema das definições é o "e se...?". Por essa razão, nem tento.
Mas, via de regra, o inventário, como o próprio nome sugere, é o procedimento que viabiliza (a) inventariar a totalidade bens (direitos e obrigações) de uma personalidade jurídica extinta (falecido)
Nesse ponto do estudo será importante destacar o fenômeno da morte no mundo jurídico. Pois a idéia de que a sucessão e o inventário seja este último judicial ou extrajudicial, têm seu ponto de partida com a morte é uma afirmação que merece ser estudada.
Provoquemos algumas perguntas.
Qual o destino dos bens de um indivíduo que desaparece por longo tempo?
E os bens dos ausentes que se ausentam sem prazo de retorno, quer por modo voluntário ou involuntário, consciente ou inconsciente?
Esses indivíduos desaparecidos e ausentes são considerados mortos? Se sim, perdem a personalidade jurídica?
Essas são questões interessantes de serem discutidas antes de entrarmos no assunto de inventário pois veremos que tais situações estão intimamente ligadas aos interesses patrimoniais das partes envolvidas (os ausentes, seus credores, devedores e os seus sucessores).
Continua....
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