CASO CONCRETO 4:
Adalto, frustrado pelas negativas de sua mulher Belízia, emprega grave ameaça com o fim de manter relações sexuais com esta por acreditar que o referido ”débito conjugal” lhe assegure o “direito de estuprar sua mulher”. Após a prática da conjunção carnal e irritado com Belízia, Adalto decide procurar outra mulher e dirige-se a um conhecido ponto de prostituição de sua cidade. Horas depois, encontra Débora, pessoa portadora de rara beleza e a indaga acerca de seus serviços. Débora, entretanto, afirma que não é prostituta, mas, garçonete e se nega a manter relações sexuais com Adalto que, ainda muito nervoso, utiliza-se de violência e obriga a vítima a retirar seu vestido, quando é surpreendido pelo fato de Débora tratar-se de um homem e não de uma mulher, razão pela qual praticou com a vítima ato libidinoso diverso da conjunção carnal. Diante do caso concreto, a conduta de Adalto amolda-se, respectivamente, aos tipos penais de estupro e atentado violento ao pudor. Com base nos estudos realizados acerca do concurso de crimes e continuidade delitiva é correto afirmar que os delitos foram perpetrados em continuidade delitiva?
GABARITO – CASO 4:
O aluno deve esclarecer quais os requisitos para a caracterização da continuidade delitiva, perpassando, necessariamente, pela discussão acerca da exigência de crimes de mesma natureza ou mesma espécie. Neste contexto, cabe salientar que o Supremo Tribunal Federal vem entendendo que crimes da mesma espécie são os que estão no mesmo tipo penal e, no caso em tela, consoante o referido entendimento, os crimes previstos nos art. 213 e 214 do CP são da mesma natureza, mas não da mesma espécie, pois estão em tipos penais distintos de modo a restar inaplicável o instituto da continuidade delitiva previsto no art. 71 do CP.
Neste sentido, vide decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal:
EMENTA: HABEAS CORPUS. PENAL. ESTUPRO E ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CONTINUIDADE DELITIVA. IMPOSSIBILIDADE. CONCURSO MATERIAL. CRIME HEDIONDO. REGIME INTEGRALMENTE FECHADO.
INCONSTITUCIONALIDADE. HC CONCEDIDO DE OFÍCIO.
A jurisprudência desta Corte está sedimentada no sentido de que estupro e
atentado violento ao pudor configuram concurso material e não crime continuado
(grifo nosso). O Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do §
1º do artigo 2º da Lei n. 8.072/90, assegurando aos condenados por crimes
hediondos a progressão do regime prisional. Habeas corpus indeferido; ordem
concedida, de ofício, para assegurar a progressão do regime de cumprimento da
pena.(STF, HC 89770/SP, Relator: Min. Eros Grau, Órgão Julgador: Segunda Turma,
Julgamento: 10/10/2006,).
No mesmo sentido, ainda que se trate de crimes
da mesma espécie, mas perpetrados contra vítimas distintas, há decisão do
Superior Tribunal de Justiça:
EMENTA. CRIMINAL. HC. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. VÍTIMAS DIVERSAS. CONTINUIDADE DELITIVA. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. CONCURSO MATERIAL. ORDEM DENEGADA.
I. Esta Corte, seguindo orientação do Supremo Tribunal Federal, já decidiu pela impossibilidade de reconhecimento da continuidade delitiva em crimes contra a liberdade sexual contra vítimas diversas, hipótese em que se incide a regra do concurso material. II. Ordem denegada.(STJ, HC 65380 / SP, Quinta Turma, Rel. Min. Gilson Dipp, julgado em 13/02/2007).
Ainda, neste sentido:
EMENTA.HABEAS CORPUS. PENAL. CRIME CONTINUADO. DILAÇÃO PROBATÓRIA. INADMISSIBILIDADE. ESTUPRO. ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR. CRIME MATERIAL.
A análise de questão relativa à verificação do preenchimento dos requisitos necessários à configuração de crime continuado não se compatibiliza com a via estreita do habeas corpus, por demandar aprofundado exame do quadro fático-probatório estabelecido no processo, em que se reconheceu a ocorrência de concurso material. É pacífica a jurisprudência desta Corte Superior no sentido de que, afora as hipóteses de praeludia coiti, os crimes de estupro e de atentado violento ao pudor, enquanto de espécies diversas, consubstanciam concurso material (grifo nosso), ainda que praticados nas mesmas condições de tempo, lugar e maneira de execução. Habeas Corpus a que se denega a ordem.(STJ, HC 80969 / SP, Sexta Turma, Rel. Min. Carlos Fernando Mathias (Juiz Convocado do TRF da 1ª Região, julgado em: 16/08/2007).
Recentemente, porém, a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal proferiu decisão em sentido contrário e entendeu ser cabível a hipótese de crime continuado:“Entendeu-se que a circunstância de esses delitos não possuírem tipificação idêntica não seria suficiente a afastar a continuidade delitiva, uma vez que ambos são crimes contra a liberdade sexual e, no caso, foram praticados no mesmo contexto fático e contra a mesma vítima” (HC n. 89827/SP, 27.02.2007).
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